Fabricar chips no Brasil exige vontade política e muito dinheiro
A crise mundial de escassez de semicondutores criou problemas, mas também oportunidades. Para aproveitá-las, no entanto, o sonho de o Brasil ingressar no seleto grupo de países que fabricam chips exige capacidade de investimentos em nível semelhante ao das maiores economias – na linha dos quase R$ 300 bilhões que os Estados Unidos decidiram aportar para atrair fábricas.
“O movimento de ampliar a capacidade e diversidade geográfica está acontecendo. É viável para o Brasil participar dessa cadeia. Porém, para realmente levar essa discussão adiante precisa se falar em montantes de investimento significativos”, avalia Cristiano Amon, presidente global da maior desenvolvedora de chips do planeta, a Qualcomm.
“Os Estados Unidos tiveram uma iniciativa excelente, o Chips Act, que são US$ 52 bilhões de investimentos em manufatura local. Essa é a escala que se precisa para semicondutores. Se o Brasil tiver disposição de investir na escala necessária, sempre vai ter espaço. Talvez seja mais difícil com tecnologia de ponta. Talvez seja mais acessível participar com tecnologias já estabelecidas”, emendou. A própria Qualcomm desistiu, ao menos por enquanto, de uma parceria para uma fábrica de semicondutores no Brasil.
Em viagem a Brasília para reuniões com o presidente Jair Bolsonaro, além de agendas com os ministros da Economia, Paulo Guedes, e das Comunicações, Fábio Faria, nesta quarta, 24/11, Amon, que é brasileiro, destacou que o mercado de semicondutores se mostrou não apenas fundamental, mas em forte crescimento. “Não tem nenhuma indústria que não esteja impactada pela crise dos componentes. Todo mundo percebeu que semicondutor é extremamente importante e quase não se tem mais indústrias imunes à isso, por conta do processo de transformação digital”, afirmou em entrevista após os encontros políticos.
A falta de chips, apontou, foi consequência direta de expectativas econômicas negativas para 2020 e 2021, especialmente a partir da pandemia de Covid-19. “Houve a pandemia, uma expectativa de recessão, e assumiu-se que a capacidade de produção de semicondutores de 2019 seria suficiente para 2020 e 2021. Todos os planos de expansão foram suspensos. Mas aconteceu o contrário. As pessoas começaram a trabalhar de casa, o consumo digital e a velocidade da transformação digital das empresas aumentou. A expansão que deveria ocorrer naturalmente e para 2020/2021 não aconteceu, e em cima disso a demanda aumentou e veio uma crise significativa”, disse.
Além do efeito colateral da retomada do mercado de computadores pessoais, que cada vez mais se aproximam dos smartphones, o período coincidiu com a chegada do 5G, que segundo Amon em nada sofreu com a pandemia de Covid-19, bem como os novos hábitos e a transformação digital. E embora acredite que a escassez de chips continue até 2023, aposta que a Qualcomm vai conseguir se recuperar antes.
“Usamos nossa escala, colocamos vários planos de expansão com basicamente todos os fabricante de semicondutores e em função disso esperamos aumento significativo na capacidade de produção já no final deste ano. Nossa estimativa é que provavelmente no primeiro ou segundo trimestre de 2022 já tenhamos equilíbrio de demanda com oferta. A indústria como um todo só vai ver estabilidade total em 2023.”
Fonte: Convergência Digital