No próximo dia 31 de maio, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) completa três décadas de existência. O órgão foi criado em 1995, por meio da Portaria nº 147 dos Ministérios da Ciência e Tecnologia e das Comunicações.

O colegiado nasceu com a missão de coordenar e integrar todas as iniciativas relacionadas àquela tecnologia que, então, começava a se expandir para além do meio acadêmico: a Internet. Anos depois, em 2003, o Comitê teve sua estrutura reformulada pelo Decreto nº 4.829 da Presidência da República, que ampliou sua representatividade e fortaleceu o colegiado como um espaço multissetorial de diálogo, com decisões tomadas por consenso.

Na ocasião, o Brasil dava um salto no debate internacional sobre governança da Internet, já que com o com o tempo, o CGI.br se consolidou como referência global no tema, formulando diretrizes estratégicas para o uso e o desenvolvimento da rede e das camadas sobre ela no País.

“O CGI.br se destaca no cenário internacional por seu modelo multissetorial pioneiro e inovador. Essa abordagem garante que as decisões sobre a Internet no Brasil sejam tomadas de forma transparente e democrática, refletindo os diversos interesses da sociedade. Por 30 anos, o CGI.br tem ajudado a construir uma Internet segura, tecnicamente sólida e comprometida com os direitos fundamentais”, afirma Hartmut Richard Glaser, secretário-executivo do CGI.br.

Debate com a sociedade

A coordenadora do Comitê Gestor, Renata Mielli, lembra que o modelo de governança da Internet no País foi resultado de um profundo debate entre sociedade e governo.

“O CGI.br já nasce pluriparticipativo, baseado num conceito de governança descentralizada e multissetorial, com o envolvimento de diferentes atores e organizações públicas e privadas. O tempo e a capacidade do modelo de enfrentar os desafios atuais provaram que a escolha feita há três décadas foi acertada.

Formado por 21 conselheiros – 9 representantes do setor governamental, 4 do setor empresarial, 4 do terceiro setor, 3 da comunidade científica e tecnológica e 1 de notório saber –, o CGI.br tem participado na formulação de políticas públicas e leis relacionadas ao ambiente online.

Em 2009, o Comitê foi responsável por publicar o Decálogo de Princípios para a Governança e Uso da Internet, que abarca questões como liberdade, privacidade, universalidade, diversidade, neutralidade e inimputabilidade da rede, entre outras.

O documento serviu de base para o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), a principal legislação sobre o tema no País, em que o Comitê teve participação na apresentação, tramitação, debate e aprovação. Anos mais tarde, a lei foi inspiração para a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), sancionada em 2018.

“A elaboração do Decálogo foi um grande momento na história do CGI.br. Ele surgiu da necessidade de reafirmar os conceitos que norteiam a Internet e, ao lado do Marco Civil, reforçou a projeção internacional do Brasil. Ganhamos destaque por construir um marco regulatório capaz de garantir uma Internet livre, aberta e com regras claras de proteção ao usuário”, recorda o diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Demi Getschko.

Reconhecimento

A atuação do CGI.br é elogiada por “construtores da Internet” e personalidades que são referência mundial na área. Convidado a falar sobre o Comitê, Vint Cerf, que ajudou a desenvolver o protocolo TCP/IP, base da rede mundial de computadores, e atualmente é vice-presidente e evangelista-chefe da Internet no Google, revisitou os primórdios do Colegiado e reforçou que a governança multissetorial tem sido um modelo para muitos. “Parabéns pelo 30º aniversário. Tenho certeza de que vocês continuarão por mais 30 anos e além”, projeta.

Conhecido por estabelecer o Network Working Group da agência governamental norte-americana ARPA (hoje DARPA) e iniciar a série Request for Comments (RFCs), Steve Crocker afirma que “em toda a história da Internet, houve apenas alguns lugares que deram, consistentemente, contribuições importantes, tanto no contexto internacional como no local, sobre áreas operacionais e de governança da Internet. O CGI.br se destaca entre os melhores casos”.

Ativista da promoção de direitos digitais na África, Nnenna Nwakanma enfatiza a atuação precursora do CGI.br. “Parabéns ao ecossistema da Internet brasileira. Por 30 anos, vocês foram pioneiros. Por 30 anos, vocês foram líderes. Vocês foram pioneiros na ICANN [Internet Corporation for Assigned Names and Numbers], no IGF [Internet Governance Forum], com o Marco Civil [da Internet], com o NetMundial. E em todos os direitos digitais.”

Presidente do Instituto Nupef e um dos fundadores do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Carlos Alberto Afonso, que participou da reestruturação do CGI.br em 2003 e representou o terceiro setor no colegiado até 2017, pontua que o Comitê Gestor foi o primeiro organismo de governança da Internet no mundo, quando o próprio conceito ainda não tinha sido formulado.

“O CGI.br, nesses 30 anos, passou por seis presidências da República, de várias tendências políticas, e foi mantido, tendo reconhecido a sua relevância por todas essas tendências. Hoje, o CGI.br tem em seu conselho representantes de entidades civis, acadêmicas e do setor privado, todos eleitos pelas suas próprias comunidades de interesse, além de representantes do governo federal. É um exemplo de parceria pluralista para a atuação comum entre governo e sociedade. O CGI.br supervisiona um centro de excelência na administração de nomes de domínio e distribuição de números IP [Internet Protocol], reconhecido mundialmente pelos seus projetos pioneiros de apoio ao desenvolvimento da Internet no Brasil, o NIC.br.”

Já o professor emérito de ciência da computação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e associado no Berkman Klein Center em Harvard, Virgilio Almeida, que coordenou o CGI.br entre 2011 e 2016, atribui o prestígio do Comitê ao modelo multissetorial de governança e ao fato de ser uma referência de estrutura “moderna, inovadora e extremamente eficiente”.

“Esse é o exemplo que o Brasil dá para a governança digital nesses tempos em que os avanços tecnológicos seguem amplamente e muito rapidamente. É muito importante para o futuro essa trajetória do CGI.br, e que continue nesse caminho de trazer ideias inovadoras para a governança do mundo digital atual.”