Anatel inicia nova fase de debate sobre big techs e contribuição em redes
Como havia sido anunciado pela agência no final do ano passado, a Anatel iniciou nesta semana uma segunda tomada de subsídios sobre os deveres dos usuários de redes de telecomunicações.
A nova fase do debate deve apontar caminhos para uma possível atuação da agência em temas como grandes plataformas digitais e a remuneração de redes, chamadas abusivas e pirataria. A principal novidade da tomada de subsídios é que desta vez a agência traz uma análise mais aprofundada sobre os temas, já indicando possíveis alternativas. Confira aqui o documento base da consulta. A reguladora vai receber contribuições da sociedade até 15 de abril.
“Quando se analisa os dados desse relatório por grupo econômico, as denominadas Big 6 (Meta, Alphabet, Microsoft, Amazon, Apple e Netflix) representam praticamente 50% do tráfego gerado nas redes. Nas redes móveis, contudo, streaming de vídeo e redes sociais respondem por 82,5% do tráfego total”, indica o documento. Ele também aponta, contudo, estudos que contradizem a tese de que as teles precisam de apoio no investimento para acompanhar a demanda por tráfego.
É neste contexto em que se insere o pleito das teles por uma “contribuição justa” (fair share, no inglês) das big techs nos investimentos de redes – ou “taxa da Internet” (network fee), como preferem as plataformas digitais. A Anatel solicitou informações detalhadas dos dois lados sobre o debate, além de indicar caminhos possíveis para regular a relação entre os setores.
Entre as alternativas listadas na tomada de subsídios estão não apenas a remuneração às teles pelo uso de redes pelas big techs (que poderia ser direcionada a um número restrito de grandes plataformas), mas também a flexibilização das regras aplicadas às próprias operadoras; novos modelos de solução de controvérsias entre as cadeias; e uma eventual contribuição das grandes geradoras de tráfego em fundos setoriais.
Contraponto
A discordância do ecossistema digital e outros atores com a ideia de contribuição das plataformas nos investimentos em infraestrutura também se fez presente no documento. Entre os argumentos estão o entendimento que a demanda por dados parte dos usuários finais, e não das plataformas, fomentando inclusive a venda de planos mais robustos pelas teles.
Outro aspecto seria o próprio investimento de big techs em redes de distribuição de conteúdo (CDNs) hoje vitais na Internet brasileira e mesmo em cabos submarinos, no caso de grupos maiores; um receio sobre a fragmentação do modelo da Internet; e preocupações sobre recursos eventualmente pagos às teles serem incorporados, ao invés de propiciar aportes em redes.
Há também o entendimento que investimentos em redes de acesso são inelásticos frente ao aumento do tráfego de dados, ao contrário dos custos com transporte e core de rede, que representariam apenas 10% a 20% dos custos da cadeia de telecom. Neste caso, o argumento é corroborado por pequenas operadoras de Internet, que não apoiam a remuneração de redes pelas big techs proposta pelas grandes teles.
“Para esse conjunto de agentes [as ISPs], haveria uma tendência de queda no tocante aos custos dos insumos de transmissão, de forma que as rubricas mais vultosas não diriam respeito à questão da capacidade, mas sim à remuneração pelo uso de postes, a direitos de passagem, ao acesso à dutos existentes, ao licenciamento de sites”, notou a Anatel.
Assimetrias
Mas no documento, a Anatel também deixou clara a preocupação com riscos do desequilíbrio entre prestadores de serviços de telecom e provedores de aplicações nos investimentos em conectividade e no ecossistema digital – sobretudo em cenário de substituição de serviços tradicionais por recursos baseadas em aplicações, como o WhatsApp e Netflix.
A agência vê assimetrias em questões relacionadas ao consumidor, em obrigações legais, em deveres de informação e de transparência com indicadores como bases de usuários, em metas de qualidade e na contribuição a fundos setoriais.
“As prestadoras de telecomunicações são obrigadas a cumprir deveres muito bem definidos […], enquanto as plataformas digitais estão quase que completamente livres dessas obrigações. Essa situação de vácuo regulatório nos mercados digitais vem gerando uma série de desafios em temas diversos como competitividade, privacidade, segurança cibernética, desinformação, disseminação de conteúdos perigosos, exclusão digital, entre outros”, afirmou a agência.
Vale lembrar que a Anatel vê a avaliação do relacionamento de operadoras de telecom com clientes pessoas físicas e jurídicas como parte de sua competência legal, a partir da Lei Geral de Telecomunicações (LGT). Por isso a discussão sobre os deveres de usuários passa não apenas pelas grandes geradoras de tráfego, mas também por players que fazem uso inadequado das redes (como responsáveis por chamadas abusivas) ou ilegal (como disseminadores de conteúdo pirata).
Fonte: Teletime (adaptado)